sábado, 25 de setembro de 2010

Jean-Jacques Rousseau

Jean-Jacques Rousseau (1712 – 1778): O homem natural é originalmente íntegro, biologicamente sadio e moralmente reto e, portanto, justo, mas a sociedade corrompeu o ser humano tornando-o mau e injusto. O desequilíbrio do ser humano não é originário, mas um desequilíbrio derivado da ordem social.

A máscara, a mentira e a densa rede de relações alienantes são efeitos da superestrutura que foi se formando ao longo de um caminho de afastamento das necessidades e das inclinações originárias. Originalmente sadio, o homem vê-se agora desfigurado; outrora semelhante a um deus, tornou-se agora pior do que animal feroz. O homem seguiu uma curva descendente.

A sociedade não pode ser curada com simples reformas, simples progresso das ciências e das técnicas. Torna-se necessária uma transformação no espírito do povo, uma reviravolta completa, uma mudança total das instituições.

O caminho da salvação é o caminho do retorno à natureza e, portanto, o caminho da renaturalização do homem através de uma reconstrução da vida social em condições de bloquear o mal e favorecer o bem.

O primeiro homem que, depois de ter cercado um terreno, pensou em dizer “este é meu” e encontrou ingênuos que nele acreditaram foi o verdadeiro fundador da sociedade civil. Quantos crimes, conflitos, homicídios, misérias e horrores teriam poupado ao gênero humano aquele que, arrancando a cerca ou tapando o fosso, houvesse gritado aos seus semelhantes: “Não deis ouvido a este impostor; estará perdidos se esquecerdes que os frutos são de todos e a terra não é de ninguém.”

A desigualdade nasceu com a propriedade. E, com a propriedade, nasce a hostilidade entre os homens. No mundo primitivo, tudo era de todos. Mas tão logo um homem precisou da ajuda de outro ou tão logo se apercebeu de que era útil para um indivíduo ter provisões para dois, então a igualdade desapareceu, surgiu propriedade, o trabalho tornou-se necessário e as vastas florestas transformaram-se em risonhos campos, que foi preciso irrigar com o suor humano e nos quais logo se viu a escravidão e a miséria germinando e crescendo juntamente com as plantações.

A sociedade que se fundamentou na propriedade privada deturpou a natureza, sendo igual a estátua de Glauco, que o tempo, o mar e as tempestades transfigurou tornando-a semelhante a uma besta feroz do que a um deus, assim sendo, a alma humana foi também alterada pela sociedade por mil causas continuamente renovadas, pela aquisição de uma grande quantidade de conhecimentos e erros, pelas mudanças ocorridas na estrutura física e pelo contínuo choque da paixões.

A sociedade se exteriorizou completamente e o homem perdeu sua vinculação com o mundo interior. É necessário operar uma nova sutura entre o interior e o exterior, para frear aquele movimento dissolutório ou dissipar aquelas vãs aparências que os homens seguem, combatendo-se e oprimindo-se uns aos outros. Recuperar o sentido da virtude, entendida como constante transparência e inter-relação entre interior e exterior.

O homem da sociedade, sempre voltado para fora de si, só sabe viver da opinião dos outros e, por assim dizer, é apenas do juízo dos outros que ele tira o sentimento de sua própria existência.

O princípio que legitima a transformação social é constituído pela vontade geral ou bem comum. Somente a vontade geral pode dirigir as forças do Estado segundo o fim de sua instituição, que é o bem comum.

A vontade geral é fruto de um pacto que se dá entre iguais, que continuam sendo tais, porque se trata da alienação total de cada indivíduo, com todos os seus direitos, a toda a comunidade, dando lugar a um corpo moral e coletivo que extrai desse mesmo ato a sua unidade, o seu eu comum, a sua vida e a sua vontade. A vontade geral não é a soma das vontades de todos os componentes, mas uma realidade que brota da renúncia de cada um aos seus próprios interesses em favor da coletividade. É um pacto que os homens não estreitam com Deus ou com um chefe, mas entre si mesmos, em plena liberdade e com perfeita igualdade.

Para estruturar o bem comum é necessária uma radicalização total visando eliminar os interesses privados. Com a vontade geral pelo bem comum, o homem só pode pensar em si quando ele pensa coletivamente, ou seja, somente através dos outros, não como instrumentos, mas como fins em si. Ninguém deve obedecer ao outro, mas sim todos à lei, sagrada pra todos, porque fruto e expressão da vontade geral. O que torna as leis tão sagradas é o fato de que as leis são emanação da vontade geral e, portanto, são sempre justas em relação aos indivíduos.

Todos os esforços que o novo pacto social impõe, portanto, estão voltados para a eliminação dos germes dos contrastes entre interesses privados e interesses comunitários, absorvendo os primeiros nos segundos e, graças à completa redução do indivíduo a membro da sociedade, impedindo que os interesses privados aflorem e rompam a harmonia do conjunto.

Não há nada de privado. Tudo é público ou, pele menos deve tornar-se tal. O homem é essencialmente social, um animal político. As ciências, as artes e as letras devem dar contribuição insubstituível nessa direção, sob a liderança carismática de uma espécie de filósofo-rei de origem platônica.

O homem só deve obedecer àquela consciência pública que é o Estado, fora do qual há apenas consciências privadas ou individuais, que devem ser condenadas porque são nocivas. Quem quer que se recuse a obedecer à vontade geral seja obrigado a fazê-lo por toda a coletividade; isso nada mais significa do que obrigá-lo a ser livre.

Encarnada no Estado e pelo Estado, a vontade geral é tudo. O contrato social dá origem a um Estado democrático, porquanto o poder não pertence mais a um príncipe ou uma oligarquia, mas sim à comunidade. O amor por si mesmo deve transformar-se em amor pela comunidade e tornar-se amor pelos outros.

A certeza de uma sociedade dominada pela vontade geral, evita que falsos sentimentos provocados por uma sociedade competitiva provoque inúmeros conflitos.

O Estado é o único órgão de salvação individual e coletiva, por ser o lugar privilegiado do desenvolvimento integral das potencialidades humanas, contra as desastrosas consequências da sociedade competitiva.

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